quarta-feira, 28 de julho de 2010

O terrorista de 1968, remunera-se em 2008

Artigo de Élio Gaspari.


Daqui a oito dias (foi escrito em março de 2008) completam-se 40 anos de um episódio pouco lembrado e injustamente inconcluso. À primeira hora de 20 de março de 1968, o jovem Orlando Lovecchio Filho, 22 anos, deixou seu carro numa garagem da Avenida Paulista e tomou o caminho de casa. Uma explosão arrebentou-lhe a perna esquerda. Pegara a sobra de um atentado contra o consulado americano, praticado por terroristas da Vanguarda Popular Revolucionária. (Nem todos os militantes da VPR podem ser chamados de terroristas, mas quem punha bomba em lugar público, terrorista era). Lovecchio teve a perna amputada abaixo do joelho e a carreira de piloto comercial destruída.

O atentado foi conduzido por Diógenes Carvalho Oliveira e pelos hoje arquitetos Sérgio Ferro e Rodrigo Lefevre e uma pessoa que não foi identificada. A bomba do consulado americano explodiu oito dias antes do assassinato de Edson Lima Souto no restaurante do Calabouço, no Rio de Janeiro, e nove meses antes da imposição ao país do Ato Institucional nº 5. Essas referências cronológicas desamparam a teoria segundo a qual o AI-5 provocou o surgimento da esquerda armada.

Até onde é possível fazer afirmações desse tipo, pode-se dizer que sem o AI-5 certamente continuaria a haver terrorismo e sem terrorismo certamente não teria havido o AI-5. O caso de Lovecchio tem outra dimensão.

Passados 40 anos, ele recebe da 'viúva' uma pensão especial de R$ 571,00 mensais. Nada a ver com o Bolsa Ditadura. Para não estimular o gênero coitadinho, é bom registrar que ele reorganizou sua vida, caminha com uma prótese, é corretor de imóveis e mora em Santos com a mãe e um filho. A vítima da bomba não teve direito ao Bolsa Ditadura, mas o bombista Diógenes teve. No dia 24 de janeiro passado, o governo concedeu-lhe uma aposentadoria de R$1.627,00 mensais, reconhecendo ainda uma dívida de R$400.000,00 de pagamentos atrasados.

Em 1968, com mestrado cubano em explosivos, Diógenes atacou dois quartéis participou de quatro assaltos, três atentados à bomba e uma execução. Em menos de um ano, esteve na cena de três mortes, entre as quais a do capitão americano Charles Chandler, abatido quando saía de casa.

Tudo isso antes do AI-5. Diógenes foi preso em março de 1969 e um ano depois foi trocado pelo cônsul japonês, seqüestrado em São Paulo.

Durante o tempo em que esteve preso, ele disse que foi torturado pelos militares que comandavam a repressão política. Por isso, foi uma vítima da ditadura, com direito a ser indenizado pelo que sofreu. Daí a atribuir suas malfeitorias a uma luta pela democracia, iria enorme distância.

O que ele queria era outra ditadura. Andou por Cuba, Chile, China e Coréia. Voltou ao Brasil com a anistia e tornou-se o 'Diógenes do PT'. Apanhado num contubérnio do grão-petismo gaúcho com o jogo do bicho, deixou o partido em 2002.

Lovecchio, que ficou sem a perna, recebe um terço do que é pago ao cidadão que organizou a explosão que o mutilou. (Um projeto que revê o valor de sua pensão, de iniciativa da ex-deputada petista Mariângela Duarte está adormecido na Câmara.)

Em 1968, antes do AI-5, morreram sete pessoas pela mão do terrorismo de esquerda. Há algo de errado na aritmética das indenizações e na álgebra que faz de Diógenes uma vítima e de Lovecchio um estorvo.


ELIO GASPARI [Wikipédia] – Nápolis – Itália (1944 - ), é um jornalista e escritor ítalo-brasileiro.

Chegou ao Brasil ainda na infância. Começou a carreira jornalística num semanário chamado Novos Rumos, e depois foi auxiliar do colunista social Ibrahim Sued, passando a seguir por publicações de destaque, como o Diário de São Paulo, a revista Veja e o Jornal do Brasil.

É comentarista do jornal Folha de São Paulo, jornal diário de São Paulo, onde está radicado, tendo seus artigos difundidos para outros jornais, dentre os quais O Globo do Rio de Janeiro, Correio do Povo de Porto Alegre e O POVO de Fortaleza.

Em seus artigos, trata com ironia as personalidades. Para tanto, lança mão de personagens como Madame Natasha, professora de português que "condena a tortura do idioma" e vive concedendo "bolsas de estudo" àqueles que se expressam de modo empolado. Já Eremildo, o idiota, é uma sátira aos que usam indevidamente o dinheiro público.

Dono de consagrada carreira no mundo jornalístico, publicou uma série de quatro livros sobre a ditadura militar brasileira, dividida em duas partes, as Ilusões Armadas e O Sacerdote e o Feiticeiro.

Importante documento deste período histórico do Brasil, Gaspari havia em 1984 iniciado suas pesquisas a partir de uma bolsa de estudos no Wilson Center for International Scholars, cuja temática seria centrada nas principais figuras do período ditatorial: os generais Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva. Embasado em documentos pessoais de ambos, a obra deslinda os bastidores do regime militar que por duas décadas mergulhou o Brasil no regime de exceção.


http://www.averdadesufocada.com/index.php?option=com_content&task=view&id=959&Itemid=34


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