sexta-feira, 23 de abril de 2010

Precipitação pela classificação

Caro Professor,


Desculpe não tê-lo respondido antes. Há alguns dias não me sinto bem fisicamente, estando com problemas de estomago, febre e diagnosticado como possuidor de uma “virose”. Esta, voce sabe, é a forma cômoda com que médicos definem algo desconhecido e, de tanto ser usado, acaba se incorporando no senso comum. Acho que a questão é não se darem ao trabalho metódico de investigação e análise, para se chegar a uma conclusão mais precisa.


E por falar nisso, acho que o Senhor cai nesse mesmo mecanismo da generalização simplista quando diz “é preciso mesmo ser muito extremista para ver as coisas de tal perspectiva!” É preciso mais profundidade para dar um “diagnóstico” diferente de “virose”.


Não vejo razão de concordância sobre a direita brasileira. Mais do que “incrivelmente envergonhada”, ela é terrivelmente incompetente não servindo nem para denunciar os podres que recheiam nossos “ilustres” representantes. É isso mesmo, nossos. Votei no PT sim. Logo, é provável (não sou doido de afirmar) que seu pensamento a meu respeito esteja equivocado professor, já que não tenho nenhum representante do PSDB ou do DEM.


A opinião sobre a rede Globo é algo que gostaria que fosse respeitada. É obvio que as revoluções deixaram de ser sangrentas, são sutis e de longo prazo, “dominando os corações e mentes” (parece que é de Sun Tsu). Se o “pensamento da extrema direita não tem raízes no sentimento” de nosso povo é uma obviedade, bem como a ideologia de esquerda, ambas importadas.


Meu problema com a rede Globo e outras emissoras não é, como disse “a questão dos costumes; de fato, os valores da sociedade brasileira mudaram muito nos últimos, digamos, trinta anos”. O problema professor Niels é que ficamos no discurso da liberdade, quando na verdade fazemos parte de uma “manada” sendo conduzida com berrantes, chicotes e mordidas (dos cães).


Não questionei em nenhum momento os maravilhosos avanços que nasceram genuinamente das demandas sociais, dos grupos e das lutas empreendidas. São formidáveis conquistas. Isso não está em questão, portanto não insinuei qualquer fracasso moral da sociedade. Porem existe uma sutil diferença daquilo que nasce como causa popular e do é induzido pela mídia como, por exemplo, o caso Lula ter se transformado em produto nas mãos de Duda Mendonça, ou de valores nunca foram sequer questionados e agora se coloca como algo já na pauta. Essa é a questão: quem faz a pauta de nossas discussões diárias ou semanais? Se, de alguma forma temos como nos defender com algum senso critico, o que podemos dizer dos milhões de brasileiros que engole “goela abaixo” como se fossem novas verdades? É isso que o senhor chama de progressista?


Caro Professor, também fui aluno de Colégio Militar por dois anos (1977 e 1978), alem disso tenho parentes militares tanto da reserva como da ativa como meu irmão que está servindo a ONU lá no Haiti. Quase nos mata de preocupação quando ocorreu o terremoto em janeiro. Saiu ileso e se sente abençoado por isso e por poder estar lá ajudando pessoas. Meu desabafo, agora sim, é por medo da configuração de qualquer extremo, e aí, tanto os regimes de extrema-esquerda como os de extrema-direita são danosos para sociedade.


Foi por isso que coloquei algumas informações colhidas de como se chegar ao poder...


1) Por "golpe" seguido de violência


2) Por "mudança de postura" política. Uma mudança no discurso, passando a ser falsamente considerado democrático. Vai assumindo características de ditadura – ex.: Venezuela (para ilustrar, assistir ao filme "A Onda" ("Die Welle" de Dennis Gansel); é muito ilustrativo.


3) Por fim, a "infiltração lenta e gradativa" em todos os setores da sociedade, por décadas seguidas, manipulando e adestrando as mentes para pensar a partir de um único ponto de vista – estratégia pregada por Gramsci – sendo o menos violento dos métodos e o mais incapacitante – ex.: Brasil??


O método do “golpe” e da “mudança de postura”, por mais violentos que sejam, não elimina a oposição do regime, que existe para vigiar e denunciar os abusos.


Quanto ao fato de afirmar que as idéias que expresso “geralmente estão associadas a outras como o racismo e o desprezo a tudo que vem das classes populares, a fórmulas para a educação dos jovens que não passam de manipulação e inculcamento de mentiras”. Bem, pelo meu histórico nesta instituição (tem pessoas que gostam, não só museus) afirmaria o contrário. Como não sei o que responder agora, tomarei umas informações, pra não ser injusto contigo e te darei uma resposta. Pode ser que esteja presente algum tipo de discriminação velada, ou de alguma forma me provocar algum dano moral. Não sei. Ainda.


Por fim, inteligente como você é, só deve estar de brincadeira comigo, e é assim que devo ver. Usar, de novo a fórmula cômoda de classificação quando me questiona, em aparente ironia, o título estigmatizante de “direitista extremista talvez libertário”, da vontade de rir, pois parece não ter entendido o teor de meu email.


Quanto a meu olhar sobre as coisas maravilhosas e “tanto progresso” é obvio que não sou cego. Vejo sim maravilhado até, pois isso é fácil, ta na cara é como o hardware do computador. Porém tem outras coisas que estão na cara e não se quer ver, por questão de princípios ou por falta deles, e por fim tem o software, aquilo que está nas entrelinhas. Como pode perceber, não dá para analisar o progresso com a postura de médico que não aprofunda seu trabalho, usando de generalizações para explicar o todo dos sintomas.


Antes que classifiquem em mais alguma categoria, gostaria de adiantar que o dinheiro que investi em psicanálise foi muito bem gasto, podem ter certeza, e que, alem de não ser dono da verdade (e quem é?). Neste momento estou exercendo meu direito de expressar meus pensamentos, e honestamente, é isso que quero que continue acontecendo.


Abraço


Lamartine

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