A História
conta-nos o quão árduos têm sido os passos visando a evolução humana. Nossos
ancestrais vivenciaram combates sangrentos nos quais eram defendidos
instintivamente seus valores culturais e crenças, batalhas em prol do que lhes
era fundamental e sagrado. No entanto, alguns passos atrás, há cerca de cem
anos, a raça humana deparou-se com um novo tipo de crença, que na verdade é a
anti-crença. Esta mensagem, de repúdio do existente à qualquer custo, é
passada por todos os meios possíveis continuamente, é defendida por pessoas
vistas como detentores de conhecimento, intelectuais. Como nos deparamos com
esse patamar histórico?
Em 1848, Karl Marx escreveu o "Manifesto
comunista", no qual convocava o proletariado do mundo a unir-se visando
instituir a Revolução Socialista, a qual daria origem à uma nova sociedade, uma
civilização ideal, sem classes sociais, sem divisões de trabalho, onde o maior
detentor de controle social seria o Estado. A partir de então, os defensores do
marxismo tinham como verdade incontestável uma breve 'socialização mundial', na
qual todos os países deixariam de existir e passariam a ser um só, e em breve
seria abolida a idéia de Estado. Marx defendia também a abolição da idéia de
pátria, já que, segundo ele, os operários nunca, de fato, tiveram pátria, e este
conceito era apenas uma idéia burguesa: "os operários não têm pátria. Não se
lhes pode tirar aquilo que não possuem."
Assim, também, Friederich Engels escreveu: "não
há nenhum país na Europa que não tem em algum canto ou outro um, ou vários,
fragmentos de povos. Os remanescentes de uma população anterior que foram
suprimidos e mantidos em cativeiro pela nação que mais tarde se tornou o
principal veículo de desenvolvimento histórico. Estes restos de nações,
impiedosamente esmagados pela passagem da história, como Hegel expressou, esse
lixo étnico, sempre se torna um fanático porta-estandartes da contra-revolução e
assim permanecerão até seu desaparecimento completo ou perda de seu caráter
nacional, assim como toda a sua existência em geral é em si uma manifestação
contra a grande revolução histórica. Todos as nações, grandes e pequenas, estão
destinados a perecer em uma tempestade mundial revolucionária. Uma guerra
mundial vai acabar com todos os países, até com seus próprios nomes. A próxima
guerra mundial resultará, não no desaparecimento da face da terra somente de
classes e das dinastias reacionárias, mas também de todo os povos reacionários.
E isso, sim, é um passo em frente."
A previsão de Engels sobre um conflito mundial
cumprira-se em 1914, no entanto, contrariando as crenças de Engels, os
trabalhadores dispuseram-se a lutar arduamente em defesa de seus países e
aderirem aos "interesses imperialistas". Apesar da contrariedade que a história
demonstrava frente à teoria, retomaram-se as esperanças socialistas quando em
1917 os russos, encantados pela idéia de uma nova sociedade, igualitária e
unida, foram os primeiros a dar vazão ao sonho marxista, quando implementaram a
"Revolução russa", de onde nascia a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas.
Seguindo o pensamento marxista, várias tentativas de revolução eclodiram pela Europa. Em 1919, eclodiu na Alemanha a Revolução Espartacista, em Berlin, liderada por Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo. Dentre as ações dos revoltos, medidas de cunho claramente socialistas foram as primeiras a serem tomadas, como abolição de latifúndios e da propriedade privada. A revolta, no entanto, foi facilmente contida. Como escreve o autor Meghnad Desai: "a derrota do levante espartacista foi rápida. (...) Dias depois foram realizadas as eleições para a Assembléia Nacional, e o SPD/USPD conquistou a maioria. Embora mais tarde a Terceira Internacional tenha exagerado muito o seu apoio popular, na ocasião do levante Karl Radek não tinha dúvida de que a Liga Espartacista deveria ter-se limitado a fazer certas demandas, em vez de tentar conquistar o poder. O sacrifício de Rosa Luxemburgo e Wilhelm Liebknecht teve a sua utilidade para a Terceira Internacional, mas eles não seguiram uma estratégia leninista, e até mesmo os bolcheviques não acreditavam que na Alemanha seria possível promover uma rebelião no estilo russo. Na verdade, os bolcheviques relataram aos espartacistas que em julho de 1917 tinham precisado desestimular trabalhadores mais afoitos, que queriam rebelar-se, e Lenin precisara esconder-se. Mas os seus contrapartes alemães tiveram menos sorte."
No mesmo ano de 1919, acontecimentos
semelhantes ocorreram em Munique, na Alemanha, onde um levante de um governo
socialista provisório não teve apoio dos trabalhadores e durou poucos dias. Na
Hungria, onde Bela Kun instituiu um governo provisório, no qual participava o
filósofo Georg Lukács, e também fracassou. A Itália também experimentou uma
Revolta sindicalista, na cidade de Turim, que não teve sucesso em implementar
seus ideais.
As idéias marxistas eram fortemente rebatidas,
não só pela falha prática, mas também teórica. Maghnad Desai retrata que até
mesmos os marxistas retrocederam: "Houve também uma mudança de percepção dos
comunistas. Embora tivesse persistido certa suspeita com relação à União
Soviética, como Uncle Joe Stalin era uma figura popular, e essa popularidade
trazia nova visão das idéias de Marx, Engels e Lenin. Era um marxismo
reducionista, mas textos até então inéditos começaram a ser publicados. Escrever
sobre Marx e debater suas idéias passou a ser uma prática mais difundida, e os
economistas neoclássicos e keynesianos começaram a confrontar Marx." As mentes
adeptas do marxismo, no entanto, não aceitam a divergência existente entre
realidade e teoria. Pat Buchanan, em seu livro, A Morte do Ocidente:
"Nada que os marxistas tinham previsto tinha acontecido. Sua hora tinha chegado e ido embora. Os trabalhadores do Ocidente, o mítico proletariado, se recusou a executar na história o papel que lhes fora atribuído. Como poderia Marx ter se enganado tanto?"
Os constantes fracassos das revoluções socialistas levaram os teóricos marxistas a uma crise: qual seria a razão pela qual os ideias socialistas não foram implementados nas demais nações além da URSS? O que poderia ser uma oportunidade de revisão e melhora da tese, ganhou uma nova perspectiva. Se a realidade não se adequar à teoria, marxistas buscaram métodos para adequar a realidade, mas não alterar a sua teoria.
A resposta aos questionamento foi alvo de
teorias de Antonio Gramsci e Georg Lukács, nas quais ambos concordavam que o
problema estava na sociedade ocidental e seus valores que alienavam os
trabalhadores - o que distorce e desvirtua um conceito do próprio Marx, que
descreve a "alienação", como fenômeno exclusivamente material e ligado à linha
de produção no trabalho, no qual o trabalhador alienado é aquele que produz um
produto mas não é seu dono - despojando-os de seu senso crítico e classicista.
Gramsci e Lukács propõem que a moral judaico-cristã seria a responsável pelas
sucessivas falhas na implantação do comunismo.
Segundo Antonio Gramsci: "o mundo civilizado
tem sido saturado com cristianismo por 2000 anos, e um regime fundado em crenças
e valores judaico-cristãos não pode ser derrubado até que as raízes sejam
cortadas". Para que os ideais marxistas tivessem livre caminho para sua
implantação seria necessário ruir os três pilares que fundamentam a cultura
ocidental: a filosofia grega, o direito romano e a moral judaico-cristã. Aos
olhos dos marxistas a teoria é inquestionável e a realidade falha, logo, deve-se
adequar a realidade para que possa ser aplicada a teoria.
Lukács relata que uma "ideologia" tem por único
objetivo evitar que os trabalhadores conquistem uma posição classista e
revolucionária e é a projeção da consciência de classe burguesa. O filósofo,
então, criou a justificativa para os fracassos socialistas, dizendo que a
"ideologia burguesa" e que o intimismo da sociedade capitalista transformavam o
indivíduo em objeto e o impediam a única consciência real e possível, que é a
consciência de classe, de vir à tona. Para isso, Lukács, deu o nome de
"reificação do indivíduo". Visando fortalecer as bases teóricas da idéia, em
1922 ocorreu a "Erste Marxistische Arbeitswoche", que pode ser traduzida como
Primeira Semana de Trabalho Marxista, reunião de diversos filósofos, que deu
origem à Escola de Frankfurt. Os teóricos da Escola de Frankfurt visavam aplicar
o marxismo de modo diferente. Nesse contexto, surgiu o que alguns chamam de
"cisma do marxismo", que, apesar da definição teórica converge com o marxismo
clássico em todos os pontos, sua aplicação passa apenas ao foco cultural, sendo
denominado Marxismo Cultural, ou Marxismo ocidental.
Esse "novo" marxismo fundamentou-se em teorias
desenvolvidas não apenas por Georg Lukács e Antonio Gramsci. Com a Escola de
Frankfurt os ideias de subversão da cultura vigente ganharam força e
espalharam-se, apoiados também em Ernst Bloch, Walter Benjamin, Jean Paul
Sartre, Louis Althusset, Jurgen Habermas, Felix Weil, Herbert Marcuse, Theodor
Adorno, Horkeimer, entre outros. A nova tática do marxismo ocorreu de maneira
silenciosa, e já fora prevista por Marx: "a sociedade passa por uma revolução
silenciosa, a qual deve ser submetida, e que não tem maior anúncio às
existências humanas que vem romper do que um terremoto no que diz respeito a
casas que destrói. As classes e as raças, fracas demais para sobreviver as novas
condições de vida, devem ceder o lugar".
Visando ruir os alicerces da sociedade
ocidental, o Marxismo Cultural abraça todo e qualquer comportamento então
marginalizado, e que vai contra os valores vigentes. Da França, o marxismo
cultural recebe importante contribuição de Jacques Derrida - que diz que através
do 'desconstrutivismo' se pode obter de um texto toda e qualquer idéia, uma vez
que, após escrita, deixa de ser propriedade da intelectualidade do autor, e se é
permitido retirar o seu entendido significado para então, a seguir, substituir
pelo sentido que se pretende para esse texto - e a manipulação de livros,
artigos, publicações e até mesmo obras de arte começa a ser feita pelos
marxistas de maneira inescrupulosa e desmedida.
Devido à falta de coesão, o marxismo ortodoxo e suas
tentativas de revolução desmoronaram como um movimento político, no entanto, os
partidários do comunismo reorganizaram-se em uma multidão de minorias. Dessa
forma, relativiza-se tudo, desconstroem-se os argumentos com objetivo de
manipulação favorável, criam-se agora as feministas radicais, os negros
extremistas, os ativistas da "paz" anti-guerra, grupos de direitos dos animais,
ambientalistas radicais, homossexuais heterofóbicos, abortistas... Todos
aqueles que se auto-definem como "politicamente corretos", grupos que buscam
seus objetivos no que forma uma complexa rede de organizações subversivas,
criando um novo, e mais perigoso, tipo de totalitarismo: o totalitarismo
ideológico.
“Tão vasta foi a propagação dessa influência, que por toda parte a idéia antiga de tolerância já se converteu na “tolerância libertadora” proposta por Marcuse: “Toda a tolerância para com a esquerda, nenhuma para com a direita”. Aí aqueles que vetam e boicotam a difusão de idéias que os desagradam não sentem estar praticando censura: acham-se primores de tolerância democrática.” - Olavo de Carvalho
Lenin já sabia que o caminho para a divulgação
dos ideias sociais era a mídia e disse em 1912: "dar à burguesia a arma da
liberdade de imprensa é facilitar e ajudar a causa do inimigo. Nós não desejamos
um fim suicida, então não a daremos." Assim, foi através da imprensa que os
valores marxistas começaram a se difundir. A ampla divulgação do amoralismo e de
uma sociedade com valores deturpados é instrumento das sistemáticas tentativas
de repressão da tão famosa liberdade de expressão. Não se deve ser complacente
assumindo uma superioridade moral, mas sim, assegurar a livre expressão
ideológica para todos, e revestir-se de argumentos honestos e verdadeiros,
principalmente quando se trata de teorias sociais e históricas.
Para que haja veracidade histórica num debate,
fazendo com que dele possa surgir alguma ação substancialmente positiva, não é
possível relativizar os fatos, mas sim, encará-los com seriedade e bom senso.
Questiona-se, no entanto, se é prudente contar com essa postura sensata dos
educadores, escritores, historiadores, formadores de opinião e etc.
Tanto o
comunismo quanto as "novas esquerdas" estão vivos e prosperam vigorosamente em
nossa sociedade, são parte do nosso dia-a-dia, e sua presença tornou-se tão
natural que não são sequer notados. Visto do panorama cultural e com olhos
de sensatez, o marxismo e sua aplicação não visam produzir uma sociedade justa e
igualitária, mas sim, renegar a natureza humana na construção de um novo ser,
destruindo todo o legado cultural, os povos e as nações que se colocarem no
caminho.
Bibliografia:
The Magyar
Struggle, Friederich Engels, Neue Rheinische Zeitung, 13 de janeiro de
1849.
Primeira
Publicação: no 'New York Daily Tribune' de 22 de marco de 1853, republicada no
'People’s Paper', Marx, Karl, de 16 de abril de 1853.
Marxism and the
Soviet Union: A Survey of Critical Theories and Debates Since 1917 - Linden,
Marcel van der Western - Tradution by Jurriaan Bendien, 2007.
The cambridge
companion to Critical Theory - Edited by Rush, Fred - Cambridge University
Press, 2004.
Jameson on
Jameson: conversations on cultural Marxism By Jameson, Fredric; Buchanan,
Ian.
Marx's Revenge:
The Resurgence of Capitalism and the Death of Statist Socialism, - Desai,
Meghnad - 2004.
The Death of the
West: How Dying Populations and Immigrant Invasions Imperil Our Country and
Civilization - Buchanan, Patrick - St. Martin’s Press, 2002.
A Escritura e a
Diferença - Derrida, Jacques -Tradução de Maria Beatriz Marques Nizza da Silva -
São Paulo: Perspectiva, 1971.
Azevedo, Pe
Paulo Ricardo -
http://padrepauloricardo.org/episodios/marxismo-cultural-e-o-comunismo
Do Marxismo
Cultural, O Globo, 8 de junho de 2002 - Carvalho, Olavo de
http://www.olavodecarvalho.org/semana/06082002globo.htm
Para ler mais a respeito, indico todas as obras e artigos do prof. Olavo de Carvalho, e também o blog: http://omarxismocultural.blogspot.com.br/
Meus agradecimentos especiais às dicas e auxílio de Filipe Martins.