Psicólogo José Lamartine de A. L. Neto
Texto apresentado no Seminário: Emoções e Afeto no Trabalho
Faculdade de Tecnologias e Ciências - 2009 (atualizado em 2018)
O naturalista Charles Darwin publicou em 1872 o livro “
A expressão das emoções nos homens e nos animais” no qual evidenciou a preocupação de que as emoções não devem ser analisadas apenas como elementos da consciência, mas como processo biológico por serem hereditários e observáveis, como as expressões faciais e outros comportamentos visíveis.
As emoções e afetos têm as funções de ajudar na sobrevivência da espécie, construção histórica da civilização, aprendizagem e ajustamento social e na expressão da subjetividade e da individualidade, sendo que o medo foi fundamental para isso.
O trabalho não deve ser apenas um processo de cumprimento e execução de tarefas pré-determinadas. Deve ser visto também como um meio de desenvolvimento e realização, principalmente quando o produto final não é um parafuso ou um automóvel, mas sim a satisfação, a saúde ou a resolução de um problema de uma pessoa ou grupo de pessoas.
Na administração das empresas os funcionários já foram encarados sob vários aspectos basicamente dentro destas duas visões: (1) abordagem Clássica de Fayol e Administração Científica de Taylor que davam ênfase na estrutura e nas tarefas, e (2) a da Teoria das Relações Humanas com ênfase nas pessoas a partir dos estudos de Elton Mayo quando dirigiu o projeto de pesquisa da fábrica de Hawthorne, entre 1927 e 1932.
Houveram críticas.
Nos Estados Unidos da época da Teoria das Relações Humanas vigorava princípios de ética e democracia muito fortes fazendo alguns estudiosos acreditarem que a origem da teoria foi uma decorrência desta "pressão". Aliada a esta crença estava a oposição exageradamente explícita à teoria clássica negando tudo o que esta preconizava e, a exagerada ênfase nos grupos informais.
Além disso, acredita-se que houve problemas no campo experimental e na parcialidade das conclusões de Mayo resultando em algum descrédito. É como se fossem consideradas verdadeiras, mas inaplicáveis. Motta e Vasconcelos (2002) citam a fala de um industrial:
"Tudo isto é muito interessante, mas o que psicólogos e teóricos em geral parecem esquecer é que tenho que obter lucro e produzir bens. O bem-estar é muito justo no devido lugar, mas é, no final das contas, um problema secundário na indústria e não a sua função principal."
Depois de muitas críticas, a Teoria das Relações Humanas foi reestruturada dando origem a Teoria Comportamental, tema de um novo texto.
Experimentamos diariamente estados emocionais diversos: ódio, amor, raiva, tristeza, asco, medo, ansiedade, surpresa, ciúme, inveja, culpa, etc. Alguns são relacionados ao pensamento e a imagens mentais, e outros, ao ambiente externo como família, grupos sociais e o local de trabalho (ZANELLI, 2004, p. 208).
As emoções e os afetos podem ser diferenciados tanto pela duração quanto pelo fato de serem visíveis ou não publicamente. O quadro abaixo dá uma amostra quanto a duração, objeto e estado.
O conhecimento acerca das repercussões das condições de trabalho sobre os trabalhadores está sendo reorganizada em dois eixos: priorizando as influências do ambiente no bem-estar do individuo/trabalhador e enfatizando estas mesmas influências sobre sua saúde, que é entendida como um sub-componente de bem-estar, representada por indicadores psicológicos (tais como afeto, frustração e ansiedade), bem como indicadores físico-fisiológicos (pressão sanguínea, funções cardiovasculares e condições físicas gerais). Logo, o conceito de bem-estar refere-se ao nível ótimo de funcionamento psicológico e de experiências positivas, resultantes da avaliação subjetiva do indivíduo sobre sua vida em geral e ou de aspectos específicos dela integrantes.
Isso repercute na Qualidade de Vida cujos fatores de influência são:
a) Administrativos e/ou organizacionais que criam facilidade e universalização de acesso, disponibilidade dos recursos e desburocratização dos procedimentos com impacto no nível de satisfação do usuário e reflexo imediato na relação prestador/usuário;
b) Ambientais se referem ao espaço, arquitetura, sinalização, etc., enfim, medidas freqüentemente simples, que facilitem a locomoção, orientação e conforto de todos, especialmente aqueles com limitações físicas, e que consigam humanizar o ambiente;
c) Tecnológicos que propiciam condições de uso, sem limitações, do melhor recurso possível e indispensável para atingir os objetivos do serviço e responder com agilidade e eficiência as necessidades do usuário;
d) Metodológicos que definem como as tarefas serão realizadas num escopo de alto desempenho envolvendo toda gama de recursos como: humanos, materiais e físicos, tendo como objetivo não a questão técnica propriamente dita, mas sim oferecer ao usuário condições que zerem ou minimizem agentes de insatisfação preveníveis e controláveis.
Além destes já citados, existem os fatores motivacionais ou satisfacientes que implicam também na qualidade de vida que guardam relação positiva com a saúde mental e emocional. Dentre eles identificamos:
- delegação de responsabilidade,
- liberdade de exercício,
- uso pleno de habilidades,
- promoção ou plano de carreira,
- segurança no cargo,
- salário,
- condições de trabalho e conforto,
- política da organização e administração,
- relação com a chefia,
- competência dos superiores,
- relações interpessoais, etc.
Suas repercussões sobre a afetividade do trabalhador, implicam em três grandes variáveis: Condições físicas; Condições temporais e Condições sociais. Estas variáveis podem refletir a presença de eventos estressores (estímulos aversivos) a partir dos líderes, características do grupo de trabalho, ambiente físico e sistema de recompensas e punições organizacionais.
Ryff (1989) elaborou uma proposta integradora ao formular um modelo de seis componentes de bem estar, composto pela Auto-aceitação, Relacionamento positivo com outra pessoa, Autonomia, Domínio do ambiente, Propósito de vida e Crescimento pessoal.
A não observação destes componentes pode resultar em sofrimento emocional caracterizado por humor deprimido, interesse ou prazer em menor grau, alterações de peso, distúrbios de sono, alterações psicomotoras, fadiga ou perda de energia, sentimento de inutilidade, além de diminui a capacidade de pensar e/ou concentrar-se, indecisão e a presença de pensamentos destrutivos.
Quando o sofrimento emocional é extremo pode desencadear uma Psicopatologia do Trabalho, caracterizados como transtorno mental, neurose ou psicose. Apresenta-se também como transtorno de ansiedade ou de humor, transtorno por uso de substâncias, de personalidade e de ajustamento. Além destes
a saúde mental no trabalho têm evidenciado dois temas de interesse de pesquisadores: o estresse ocupacional e a Síndrome de Burnout.
O estresse ocupacional é resultante de um complexo conjunto de fenômenos que age sobre o trabalhador. Cooper e Marshall (1978) pesquisando o tema, desenvolveram um modelo com seis categorias de fonte de estresse:
Fatores intrínsecos do trabalho;
Papel da organização;
Relacionamento no trabalho;
Desenvolvimento de carreira;
Estrutura e clima organizacionais e
Interface entre lar e trabalho
Já a Síndrome de Burnout é definida como uma resposta prolongada a agentes estressores do contexto do trabalho. Como causa, existem três elementos: características das tarefas; categoria ocupacional e; características organizacionais.
Quanto as manifestações afetivas discretas no ambiente profissional, elas ocorrem devido à percepção de injustiça ou por conflitos interpessoais, e são manifestadas através da raiva, da agressividade e de comportamentos de retaliação.
As incertezas sobre o desempenho de papeis, as transformações organizacionais imprevisíveis, o destino da carreira e o vínculo organizacional, geram insegurança, potencializando as emoções negativas nas organizações.
Por isso mesmo, as emoções e afetos no trabalho tem gerado interesse crescente por parte dos estudiosos, provocando uma reavaliação das relações de antagonismo entre Razão vs. Emoção e Cognição vs. Emoção.
Jaques-Jesus (2004) aponta para a
“indispensabilidade da Psicologia na explicação e intervenção sobre os fatores de saúde do trabalhador 'invisíveis' à fisiologia e à bioquímica médicas. Esses fatores são ressaltados pelas particularidades dos casos, que se desdobram no contexto das teorias de estresse, psicodinâmica do trabalho e abordagem epidemiológica e/ou diagnóstica”
Assim, Bastos (2009) afirma que em um sentido amplo, os projetos de pesquisa deverão voltar-se para compreender o papel das pessoas – nos diferentes papéis que podem desempenhar – como construtoras de organizações e como tal construção retroage sobre o próprio trabalhador, afetando a sua identidade, os seus modos de vida e de existência e a sua saúde psicológica, em particular.
Uma das propostas dos estudiosos é o conceito de inteligência emocional, que segundo seu criador Daniel Goleman é constituída das variáveis autoconsciência, autocontrole, auto-motivação, consciência das emoções das outras pessoas e capacidade de gerir as suas relações.
Já o trabalho de Evison (2001) traz a importância do autogerenciamento das emoções que, segundo ele depende basicamente do equacionamento entre pensamento, avaliação cognitiva, sentimento e ação. Enfatiza também que devem existir mecanismos para ampliar a resiliência e a auto-eficácia, termo criado por Albert Bandura.
A Psicologia deve usar uma visão biopsicossocial, integral e sistêmica das relações dentro das organizações. Representando o diferencial para a realização de diagnósticos, definição de ações, campanhas, criação de serviços e implantação de projetos que sejam voltados para a preservação e desenvolvimento das pessoas durante o trabalho na empresa.
O Psicólogo, na visão biopsicossocial e ética da condição humana, deve atuar para identificar, eliminar, neutralizar ou controlar os riscos para o bem-estar emocional no ambiente físico, sensibilizar a alta direção da organização quanto a necessidade de mais informações e mais transparência nas mudanças, deve treinar gerentes e empregados para o auto e o hetero-gerenciamento emocional. Alem de criar espaços para canalizar emoções negativas e gerenciar o uso do “Trabalho Emocional”, ou seja, o Psicólogo deve zelar pelo equilíbrio emocional das pessoas.
Curiosidades:
Uma lista com os melhores lugares para trabalhar é feita a partir de critérios internacionais de qualidade de trabalho. Avalia aspectos pelo lado da empresa e do empregado. “The Great Place to work” usa os critérios da remuneração, benefícios, oportunidades de carreira e treinamento, segurança e confiança na gestão, orgulho do trabalho e da empresa, clareza e abertura na comunicação interna, camaradagem no ambiente de trabalho e responsabilidade social. Está disponível no link abaixo.
REFERÊNCIAS:
BROCHIERI, in De Masi, A sociedade pós-industrial, 1999
COOPER, C.; MARSHALL, J. Sources of Managerial and White Collars Stress. In: COOPER, C.; PAYNE, R. (Eds.) Stress at Work. New York: John Wiley e Sons, p. 81-105, 1978.
DEJOURS, C. A Loucura do Trabalho. São Paulo: Cortez/oboré, 1987.
DEJOURS, C. Psicodinâmica do Trabalho. São Paulo: Atlas, 1994.
EVISON, R. Helping individuals manage emotion response. In: PAYNE; COOPER. Emotions at work. Chichester. John Wiley & Sons. 2001
KAPLAN & SADOCK, Compêndio de Psiquiatria. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
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http://www.pospsi.ufba.br/trab.html Acessado em 11 de junho de 2009
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MITNICK, Kevin D.; Simon, William L. A Arte de Enganar Ataques de Hackers: controlando O Fator Humano na Segurança Da Informação. São Paulo. Makron Books. 2006
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THE GREAT PLACE TO WORK. Disponível em http://www.greatplacetowork.com.br/pesquisa-e-benchmark/ranking-melhores-empresas-para-trabalhar.htm